Um poema desconhecido de Hilda Hilst foi identificado por Milena Wanderley, doutoranda em Letras pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, no acervo do arquivo Edgard Leuenroth, AEL.
Escrito em 1949, quando Hilda tinha apenas 19 anos, o poema “sem título” foi publicado no mesmo ano pelo jornal Tentativa, de Atibaia.
No acervo do CEDAE, Milena também identificou outro poema “sem título”, desta vez na revista Colégio, dirigida por Roland Corbisier e publicada em São Paulo, em 1949. Localizado em 2016, o mesmo foi incorporado à coletânea Da poesia, publicada recentemente pela Companhia das Letras.
Leia os dois textos abaixo:
Fracassamos. Seremos os eternos fracassados.
Mas daqui a sete mil anos
abriremos as portas de todos
os claustros e lá nos encerraremos.
Seremos então os primeiros enclausurados
puros,
brancos,
mãos brancas, rosto branco
BRANCO – Ausência de amor.
Não haverá sinos em nossos campanários
(nem sinos, NEM AMOR)
qualquer luz em nossas celas
iluminará somente os livros
de quotidiana meditação.
Fomos improdutivos. Fomos estéreis.
Naufragamos no mar da compreensão.
Prostituímos ternamente as cousas que só nós entenderíamos.
E nos tornamos eternos fracassados…
Não haverá sinos em nosso campanários
(nem sinos, NEM AMOR)
In: Tentativa, Atibaia, p. 2, jun. 1949.
Não existe amanhã...
Amanhã será um grande dia triste
como o dia de hoje.
Amanhã, vou chegar perto daquela árvore
ao lado do rio, e de qualquer outro modo
me matarei.
Não importa o que os amigos vão dizer
nem a decepção que Augusto meu grande
e maior amigo vai ter.
Talvez eu precisasse dizer aos outros
muita coisa, mas seria inútil porque
nem o homem, nem a mulher amiga,
haveriam de realizar o sentido imenso
dessa minha conclusão.
Eu desejei amigos e livros: Tive.
Desejei amor, também tive...
apesar de ele nunca ter dito.
Amanhã desejarei morrer.
Mas vou morrer sem barulho, docemente
e ninguém vai descobrir o quanto eu
compreendi para chegar ao final.
Escutem meus amigos: A morte é grande
muito grande, imensa, e se todos
compreendessem, haveriam de morrer
sem barulho, docemente como eu.
Vou matar-me amanhã.
E que dia comprido o dia de hoje.
In: Colégio: revista de cultura e arte. São Paulo, ano II, n. 5, p. 112 e 113, 1949.