Ferreira de Castro
1898-1987
TÁBUA BIOGRÁFICA
1898 - Nasce em Salgueiros (Aveiro), a 24 de maio.
1911 - Embarca para Belém do Pará, e de lá segue para o seringal Paraíso, no rio Madeira, interior do amazonas, onde faz suas primeira tentativas literárias.
1914 - Abandona a mata e regressa a Belém, onde, em meio aos mais diversos serviços, inicia sua carreira literária com um romance, Criminoso por Ambição.
1916 - Encontra uma tipografia que lhe publica, o primeiro romance, em fascículos distribuídos aos assinantes pelos empregados do editor e por ele próprio.
1919 - Regressa a Portugal, em setembro, e entrega-se à atividade jornalística, ao mesmo tempo que prossegue a sua carreira literária.
1922 - Mas ..., livro de pequenos ensaios literários e sociológicos. Funda a revista A Hora, é redator do jornal O Século e da revista ABC, diretor de Civilização e do semanário O Diabo.
1928 - Com a publicação de Emigrantes, em que registra aspectos de sua própria experiência no Brasil, passa a gozar de prestígio e inicia uma nova fase literária.
1930 - A Selva, romance inspirado na experiência do autor na floresta amazônica, alcança grande êxito e renome europeu.
1934 - Terra Fria.
1940 - A Tempestade.
1947 - A Lã e a Neve.
1950 - A Curva da Estrada.
1957 - A Missão.
1968 - O Instinto Supremo, romance inspirado na epopéia humanitária do Marechal Rondon, o pacificador do índios do Brasil.
1987 - Falece a 29 de junho, no Porto.
[...]
Estendido onde a sombra lhe parecera mais agradável, Manuel da Bouça seguia o trabalho da ave e recordava o tempo da infância, já distante, em que vasculhava veigas e montes à busca de ninhos, só pelo prazer de os descobrir e disso se vangloriar ante o rapazio do lugarejo. Outrora não teria hesitadoe, zape-zape, pinheiro arriba, iria ver em que estado se encontrava o novo berço e voltaria, depois, pelos ovos ou pelas avezitas ainda implumes, as pálpebras cerradas e o biquito glutão semiaberto ante qualquer ruído. Mas, hoje, só se fosse em pinheiro baixo e de gaio ou de rola, que eram bons com arroz.
Felizes tempos esses em que pastoreava a cabra pelas barrocas, roubava maçãs na quinta do Almeida e seguia, na Primavera, o vôo dos pássaros de ramo em ramo!
Fincou a mão enegrecida e calejada sobre a caruma e, retesando os músculos, ergueu-se. Logo, porém, uma dor vivíssima o obrigou a sentar-se de novo. Então, ele colocou a perna esquerda sobre a direita e pôs-se a examinar a planta do pé - os olhos atentos e o indicador tacteando. Era ali ...
Do bolso do colete sacou o canivete, abriu-o e começou a tirar fatias de pele dura e gretada. Lá estava o maldito! Um ponto negro, pouco maior do que cabeça de alfinete, mas tão doloroso como raiz de dente. Com muito cuidado, devagar, para que a lâmina não resvalasse, extraiu o espinho. E uma gota de sangue veio borbulhar no orifício que ele deixara.
[...]
FERREIRA DE CASTRO, Emigrantes.
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